Acordo entre Codelco e SQM para exploração de lítio pode não ser a melhor opção para o Estado
O acordo final entre a mineradora estatal chilena Codelco e a SQM para a exploração de lítio no Salar do Atacama entre 2025 e 2060 pode não ser benéfico para o Estado, segundo alguns players do setor.
A proposta aumenta a participação do Estado nas receitas provenientes da produção na área e concede o controle majoritário do empreendimento à maior produtora mundial de cobre a partir de 2031. No entanto, aspectos como preço, benefícios para as comunidades indígenas, questões ambientais e valor agregado não foram incluídos nas cláusulas da parceria privada, o que geraria incerteza sobre o valor real do acordo.
Embora o acordo seja uma melhoria em relação à participação de 50%+1 prevista anteriormente para o Estado, “se as condições atuais do contrato da SQM forem mantidas, não será um bom negócio para o Chile”, disse à BNamericas Ariel León, assessor jurídico da comunidade indígena Colla Pai Ote, que vive no entorno do Salar de Maricunga.
Com base no acordo, a SQM transferirá todas as suas concessões minerárias em Maricunga para a Codelco, e o Estado receberá 70% da margem operacional da produção entre 2025 e 2030, aumentando para 85% quando o contrato de arrendamento que a SQM tem com a agência de desenvolvimento Corfo expirar, em 2030.
A indefinição do preço de transação do lítio na parceria é uma questão que preocupa devido à volatilidade do mercado.
No primeiro trimestre, as receitas da Corfo provenientes dos contratos de exploração de lítio com a SQM e a norte-americana Albemarle caíram 51,4% em comparação com o trimestre anterior, quando totalizaram 1,57 trilhões de pesos (US$ 1,71 bilhão).
A queda se deveu a uma diminuição nos preços do carbonato e hidróxido de lítio, de acordo com um relatório do departamento de orçamento do Chile.
A produção de 300.000 t/ano de carbonato de lítio equivalente é estimada para o período de 2025 a 2030, enquanto de 2031 a 2060 seriam produzidas 280.000-300.000 t, mas os cálculos dos lucros fiscais só podem ser feitos se houver visibilidade dos preços.
A venda de lítio da SQM utiliza o preço do mercado spot, condição que gera incerteza na arrecadação para o Estado no longo prazo. No final de maio, o preço spot do carbonato de lítio girava em torno de US$ 14.000/t, bem abaixo dos US$ 80.000/t de 2022.
Além disso, a falta de clareza em relação ao valor de venda definido nos acordos da SQM com empresas como a Ford ou a LG, para as quais é um fornecedor-chave, também é criticada.
Em contrapartida, a tendência atual nos negócios de lítio é caracterizada por contratos de longo prazo com fabricantes de veículos elétricos ou de baterias, algumas vezes envolvendo a propriedade direta dos projetos, com um preço de venda de US$ 25.000/t, em média, ou um valor mínimo acordado. Diversos analistas preveem que, em médio e longo prazo, o preço do carbonato de lítio continuará sob pressão devido ao aumento da oferta global.
Outra exigência do acordo afetará Julio Ponce Lerou, antigo controlador da SQM que esteve envolvido em diversas violações da lei do mercado de valores mobiliários em 2018, já que não será permitido que um membro do conselho de administração da joint venture entre as subsidiárias SQM Litio e Tarar ocupe o cargo por mais de 10 anos, sejam eles contínuos ou não.
A cláusula é “um capricho político infundado”, afirmou Joaquín Villarino, diretor executivo do grupo Consejo Minero, em entrevista a uma rádio nesta sexta-feira (31), embora a exigência não isente os familiares do empresário, ponto que foi criticado por um grupo de parlamentares pró-governo.
“Esperamos que o acordo seja ambientalmente sustentável e defina os valores de indenização que os povos indígenas receberão para proteger sua cultura. Deve haver uma distribuição equitativa de benefícios às comunidades, além de garantir nossa participação nos conselhos de administração das empresas”, disse León.
O consultor independente e presidente do Centro de Estudos de Minerais Estratégicos e Críticos do Chile, José Cabello, lamentou que não se fale em valor agregado, como a fabricação de baterias, e criticou a abordagem adotada para a transparência.
“Eles disponibilizam um site para consultas quando o acordo já está fechado. É falta de ética por parte de uma estatal de grande porte. Também não há menção à Corfo, dona do salar, nem à Comissão Chilena de Energia Nuclear, que também deveria intervir, porque o lítio é propriedade do Estado”, destacou ele à BNamericas.
Por outro lado, Álvaro Merino, diretor executivo da consultoria local Núcleo Minero, não acredita no sucesso do acordo e defende a liberalização da indústria do lítio.
“O lítio deveria receber o mesmo tratamento jurídico que outras substâncias minerais, como o cobre, o ferro e o ouro. Ele deve ser acessível para que o setor privado possa ter acesso aos recursos, pois não há nada mais estratégico para um país do que aumentar suas atividades econômicas”, avaliou o especialista à BNamericas.
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