
Projeto de reforma econômica de Milei: as principais medidas para o setor energético

O projeto de “lei ônibus” do presidente argentino Javier Milei terá repercussões para o setor energético.
O texto de legislação é a mais recente dose de terapia de choque, após o amplo decreto da semana passada focado na desregulamentação.
A proposta de reforma, com 350 páginas, contém uma série de medidas gerais e setoriais, como o reforço dos poderes de política econômica do libertário Milei e a privatização de 41 empresas estatais. Entre os afetados estão a petrolífera estatal YPF, o player de infraestrutura energética Energía Argentina e a empresa de energia nuclear Nucleoeléctrica Argentina.
Um capítulo inteiro aborda a flexibilização do controle estatal sobre a indústria do petróleo e do gás, uma fonte abundante para a economia abalada. A exploração de xisto de Vaca Muerta está atraindo a maior parte do investimento, em meio a uma tendência de declínio da produção de hidrocarbonetos convencionais.
Em uma publicação nas redes sociais, o consultor de energia e acadêmico Juan José Carbajales afirmou que a mudança mais radical proposta refere-se à liberdade para exportar concedida às empresas petrolíferas. Atualmente, existe um mecanismo para garantir que as necessidades internas sejam atendidas com prioridade.
Os controles, no entanto, permaneceriam em vigor para o gás natural. Apesar de impulsionar a produção e a infraestrutura, a Argentina não consegue atender os picos de demanda de gás com a produção interna e precisa importar GNL, o que representa um grande gasto para os cofres já desgastados do país.
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O projeto de lei estabelece que “as exportações de gás natural deverão ser regulamentadas pelo Poder Executivo Nacional”.
Sobre a iniciativa geral, Carbajales indicou que “o princípio que ilumina todo o projeto é a eliminação de toda intervenção estatal, para favorecer a livre iniciativa privada e, assim, adquirir eficiência, transparência e competitividade”.
No setor de petróleo e gás, “se [o projeto de lei] prosperar, estimulará Vaca Muerta, aumentará os custos locais de energia, bem como a participação do governo, por meio da cobrança/retenção de impostos/exportações pela YPF. Porém, outras contas sofrerão e o governo perderá ferramentas de gestão diante de uma eventual crise (empresas públicas)”, acrescentou.
O projeto declara estado de calamidade pública até 31 de dezembro de 2025, prorrogável por até dois anos.
Enquanto isso, Milei enfrenta o desafio de fazer avançar o projeto de lei em um Congresso fragmentado, onde não detém a maioria de votos. Ambas as câmaras também devem decidir se o decreto – um tipo especial de ordem que pode ser usada em circunstâncias excepcionais – permanecerá em vigor.
O libertário está apostando em um grande impulso de desregulamentação e privatização para tirar o país da estagnação econômica, com medidas que incitaram a oposição e provocaram protestos.
As empresas que estão ponderando grandes despesas em áreas como o GNL e o hidrogênio, provavelmente aguardarão, por enquanto, sinais de estabilidade econômica, política e regulamentar a longo prazo. Os investidores procurarão incentivos específicos, como benefícios fiscais e controle de capital.
A BNamericas analisou algumas medidas contidas no documento, que pode ser acessado por meio do link, no canto superior direito desta página.
POLÍTICA ENERGÉTICA ESSENCIAL
O projeto confere ao Poder Executivo a autoridade de estabelecer políticas nacionais nas áreas de extração, processamento, transporte, industrialização, comércio e licenciamento de hidrocarbonetos.
Segundo o projeto, os proprietários de concessão e licenças terão domínio sobre os hidrocarbonetos que extraem, podendo transportá-los, vendê-los e industrializá-los livremente. O Poder Executivo não poderá intervir ou estabelecer preços no mercado interno, em qualquer fase do processo de produção.
Um artigo sinalizou que “os proprietários de concessão e licenças, refinadores e/ou comerciantes poderão exportar livremente hidrocarbonetos e/ou seus derivados, de acordo com a regulamentação determinada pelo Poder Executivo, que estabelecerá as condições para sua efetiva entrada em vigor.”
Serão eliminadas as regras que concedem privilégios às empresas estatais, como a reserva de áreas de hidrocarbonetos e a obrigação de atribuir a elas participações em projetos – como é o caso da GyP, da província de Neuquén.
Outro artigo, de carácter geral e citando as circunstâncias econômicas excepcionais do país, afirma que os contratos que estabelecem obrigações assumidas pelo Estado podem ser renegociados ou anulados.
ENERGIA ELÉTRICA
No caso da energia elétrica, o Poder Executivo está autorizado a modificar o marco regulatório.
Os objetivos são aumentar a dimensão do mercado e a concorrência e regular as exportações, assegurando a atendimento da demanda interna. O despacho usaria um mecanismo baseado em custos marginais.
A proposta aborda a liberdade que será dada aos usuários finais para escolher o fornecedor, o desenvolvimento de infraestrutura e a administração do mercado. Em relação às infraestruturas – que precisam ser construídas para apoiar a adição de nova capacidade de energias renováveis. O texto menciona “o desenvolvimento de infraestruturas de energia elétrica por meio de mecanismos abertos, transparentes, eficientes e competitivos”.
Atualmente, as obras de ampliação da transmissão são custeadas pelo Estado.
REGULADORES
O projeto de lei propõe a fusão em um único órgão do regulador de energia elétrica Enre e do regulador de gás Enargas. O governo anterior assumiu o controle administrativo de ambas as entidades.
IMPOSTO RETIDO SOBRE EXPORTAÇÃO
Os impostos retidos na fonte sobre a exportação de petróleo estão congelados em 8%, embora o projeto de lei conceda ao Poder Executivo a capacidade de aumentar as taxas até 15%, no máximo.
Os impostos foram introduzidos para ajudar a abastecer os cofres do Estado.
DIREITOS PROVINCIAIS
É estabelecida uma taxa base de 15% para novas licenças de concessão e medidas para estimular a concorrência. Segundo a proposta, esta taxa será “o único mecanismo de rendimento”, e outras taxas para angariar fundos não poderão ser aplicadas pelas jurisdições correspondentes à produção.
PARIDADE DE EXPORTAÇÃO
O alinhamento dos preços locais do petróleo bruto com os preços internacionais – é isso que a lei permite – é um apelo comum entre o setor de hidrocarbonetos da Argentina.
O preço local do barril de petróleo foi estabelecido em conjunto pelos produtores, pelas refinarias e pelo governo.
EXPLORAÇÃO
O projeto permite que qualquer pessoa “com capacidade civil” realize trabalhos de exploração em terra ou na plataforma continental, excluindo áreas protegidas ou já licenciadas.
A proposta legislativa define o que é a extração de hidrocarbonetos não convencionais e estabelece regras de licenciamento. As autoridades executivas nacionais ou provinciais podem outorgar concessões.
As alterações determinam que as licenças não convencionais não poderão ser prorrogadas por mais 10 anos e estabelecem a duração das concessões.
– Licenças de extração de hidrocarbonetos convencionais: 25 anos
– Licenças de extração de hidrocarbonetos não convencionais: 35 anos
– Licenças de extração de hidrocarbonetos convencionais na plataforma continental e no mar territorial: 30 anos.
BIOCOMBUSTÍVEIS
O projeto de lei propõe a desregulamentação do preço edas cotas de biocombustíveis, embora mantenha a exigência de utilizar 7,5% de biodiesel na mistura de diesel acabado e 12% de bioetanol na mistura de gasolina acabada.
MEIO AMBIENTE
O projeto de lei autoriza o Poder Executivo Nacional, juntamente com as províncias, a desenvolver uma legislação ambiental nacional unificada.
TRANSIÇÃO ENERGÉTICA
O Poder Executivo, segundo o projeto, está autorizado a estabelecer e atribuir direitos de emissão de gases de efeito estufa a cada setor e subsetor da economia.
O projeto de lei também autoriza as autoridades a estabelecer um mercado de direitos de emissões de gases de efeito estufa e definir as regras.
A Argentina, responsável por 0,83% das emissões globais de gases com efeito de estufa, pretende reduzir as emissões em 19% até 2030, em comparação com um recorde histórico alcançado em 2007.
O país pretende atingir emissões líquidas zero até 2050. As políticas e ações atuais são “altamente insuficientes”, de acordo com o projeto governamental de monitorização da ação climática Climate Action Tracker.
Milei já havia se posicionada como negacionista em relação às mudanças climáticas, mas a sua declaração de campanha indicava pragmatismo em termos de investimento em energia limpa. A necessidade pode obrigá-lo a atuar, dado que a Argentina é um grande exportador e enfrenta o risco de estar sujeita a impostos sobre carbono, minando a competitividade dos seus produtos.
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