A avaliação do Citi para o crescimento do project finance na América Latina
O Citi vê o Brasil e o Chile como os principais países da América Latina para project finance em 2023, impulsionados pela forte demanda por financiamento para projetos de energia elétrica, enquanto no Brasil áreas como saneamento e FPSOs também têm apresentado crescimento.
O México deve ser um terreno fértil para o financiamento de projetos no ano que vem, segundo Daniel O’Czerny, diretor de financiamento de infraestrutura global do gigante bancário dos EUA para a América Latina.
BNamericas: Quais países da América Latina são responsáveis pelo maior volume de negócios em termos de financiamento de infraestrutura para o Citi hoje e como a área deve se comportar em 2023?
O’Czerny: Nosso escopo de atuação na área de infraestrutura aqui no Citi está vinculado a projetos greenfield e brownfield. Ou seja, também inclui serviços de assessoria para M&A onde uma solução em termos de project finance é necessária.
Olhando sob esses dois aspectos, os maiores geradores de negócios para operações de project finance têm sido o Brasil e o Chile.
Fora esses dois países, eu diria que existem outros grandes na região, que passam por uma situação política um pouco mais delicada, como México e Argentina, enquanto na Colômbia, apesar de ser um país ativo em termos de projetos, eles não são tão grandes.
Falando sobre o cenário de 2023, vejo uma situação bem parecida, com Brasil e Chile sendo responsáveis pelo maior volume de operações.
Um aspecto que eu destacaria é o fato de que, em 2023, começaremos a ver um pouco mais de atenção voltada para o México, diante das expectativas para as eleições que ocorrerão no país [no meio de 2024], já se olhando para uma mudança de governo.
BNamericas: Nos países que você mencionou, as operações de project finance estão concentradas em quais segmentos?
O’Czerny: No Brasil e no Chile temos algumas semelhanças em relação aos setores, já que, por exemplo, o setor elétrico tem sido um grande gerador de operações.
No Chile, as maiores operações estão concentradas em projetos de transmissão de energia e, no Brasil, além da transmissão, tem muita coisa acontecendo também na geração de energia renovável.
Também gostaria de chamar a atenção, do ponto de vista positivo, para as operações ligadas ao setor de rodovias na Colômbia.
BNamericas: Segundo fontes do governo brasileiro, com Ilan Goldfajn como presidente do BID, o banco apoiará projetos estruturantes na região, como a conexão dos campos de gás de Vaca Muerta, na Argentina, ao Brasil por meio de um gasoduto e uma ferrovia, e um corredor logístico entre Brasil e Peru. Você vê chances de avanços nesses projetos?
O’Czerny: Há uma necessidade de projetos estruturantes na região, mas o caminho para isso deve começar com uma boa estruturação de projetos.
É claro que projetos tão grandes como os que você mencionou precisarão da participação de instituições multilaterais, mas, para que isso avance, será necessário alocar os riscos negociados entre os países. Acho que hoje existe um cenário complexo na Argentina, onde há um baixo nível de investimento em infraestrutura, então isso precisa ser muito bem pensado.
O Ilan, no BID, pode ajudar a desatar alguns nós pela competência dele e, além disso, o BID também conta com a Martha Seillier, que trabalhou no PPI e tem uma experiência considerável na estruturação de projetos.
BNamericas: Falando agora sobre o Brasil, quais são os setores que devem gerar mais negócios para os financiadores de infraestrutura?
O’Czerny: O setor de energia, que já mencionei, e, além dele, destacaria outros dois setores.
Um deles é o saneamento, que tem passado por uma grande transformação no Brasil e gerado um grande volume de operações. Hoje estamos muito focados nesse setor.
Outro setor em que focamos é o de óleo e gás, e aqui divido o segmento em dois. Um deles inclui os negócios gerados a partir do plano de desinvestimentos da Petrobras, que trouxe empresas independentes para o setor, que estão investindo.
O outro ponto positivo do segmento são os FPSOs [unidades flutuantes de produção, armazenamento e transferência]. Os bancos locais não são muito competitivos no financiamento de FPSOs devido a questões relacionadas ao câmbio, então olhamos para esse setor.
Cada FPSO hoje representa um negócio de US$ 2 bilhões, e temos uma demanda de cerca de três ou quatro FPSOs por ano no Brasil.
Os bancos mais ativos no segmento de FPSO têm sido europeus, japoneses e nós. É um setor em que somos líderes e também já realizamos muitas operações de refinanciamento.
BNamericas: Uma tentativa de implementar mais regras de conteúdo local no setor de óleo e gás por parte do novo governo pode afetar a estrutura de financiamento de projetos?
O’Czerny: As mudanças nesse setor demoraram muito para acontecer, porque a definição de conteúdo local se dá no momento da licitação.
Entre a conquista da licitação e a demanda pelo FPSO, estamos nos referindo a um prazo médio de sete anos. Eu diria que construir um FPSO no Brasil não é uma decisão trivial.
Em relação à estrutura de financiamento desses FPSOs, no passado, ao longo dos últimos 10 anos, esses financiamentos eram de longo prazo, em torno de 17 anos. Agora, com algumas mudanças na regulação de capital para os bancos, vejo os bancos reticentes em oferecer financiamentos de tão longo prazo.
BNamericas: Vocês têm interesse em algum outro segmento?
O’Czerny: Também atuamos no setor de telecomunicações, especialmente vejo operações acontecendo nas áreas de fibra ótica e datacenter. Enquanto isso, o maior investimento em 5G virá de empresas que usam um modelo de crédito mais corporativo [em vez de soluções de project finance].
BNamericas: Quais são suas expectativas em relação à agenda de concessões no Brasil a partir de 2023, com um novo governo?
O’Czerny: Acredito que haverá uma continuidade da agenda de concessões.
Mesmo nos governos anteriores [de esquerda] de Lula e Dilma Rousseff, vimos um programa de concessões, principalmente de rodovias e aeroportos.
Mas é importante dizer que há setores que já estão concluindo a oferta de ativos, como os aeroportos, onde já não há muitos ativos a serem oferecidos.
No setor rodoviário, ainda há muitas concessões possíveis.
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