A ‘trágica’ queda na produção de ouro no Peru
Em 2009, o Peru produziu 183 t de ouro, mas no final de 2021 produziu apenas 96,5 t, “algo trágico”, segundo José Augusto Palma, presidente do 14º Simpósio Internacional de Ouro, Prata e Cobre e vice-presidente de assuntos jurídicos e corporativos da Hochschild Mining.
Em março deste ano, a produção de ouro foi de 7,5 t, uma queda de 9,4% em relação ao ano anterior. Enquanto isso, no primeiro trimestre de 2022, atingiu 22,3 t, uma contração de 2,1% na mesma comparação.
Nesse contexto, Palma oferece à BNamericas uma análise dos motivos para a baixa produção do metal precioso no Peru e das perspectivas da mineração no país.
BNamericas: Os últimos relatórios do Ministério de Energia e Minas confirmam que a produção de ouro no Peru continua em queda, a que se deve esse fenômeno?
Palma: Vemos com grande preocupação o que está acontecendo com a produção de ouro no Peru. Há uma desaceleração acentuada que reduziu quase pela metade a produção desse metal em apenas dez anos. E isso é trágico porque temos um enorme potencial de ouro e também de outros metais. Achamos que não está sendo feito o necessário para identificar esses depósitos e colocá-los em produção. E isso se deve a dois motivos: a falta de exploração, que tem a ver com o processo de permissão (burocracia) que prevaleceu no Peru, e que nos faz ter uma tendência de queda na nossa competitividade, e os conflitos sociais.
Em 2006, eram aplicados 25 regulamentos à mineração, hoje são aplicados 400 e mais de 100 procedimentos administrativos.
Como mineradores formais, somos a favor do cumprimento dos mais altos padrões ambientais e das melhores práticas em termos de gestão social, mas acreditamos que há um enorme espaço para agilizar normas e procedimentos.
Um processo de exploração não pode demorar mais de 18 meses, quando em países vizinhos os procedimentos demoram uma fração disso. Em dois ou três meses é possível explorar no Brasil, México, Chile ou Colômbia. Isso nos torna menos atraentes, e isso foi confirmado pela última pesquisa do Fraser Institute.
Sem exploração não vamos identificar novas jazidas e também não vamos recuperar as reservas que estão sendo consumidas com a produção, porque eventualmente elas se esgotam.
BNamericas: De fato, se analisarmos o portfólio de projetos de mineração do Peru, apenas seis são ouro e três são prata, o restante é cobre.
Palma: Quase 70% do portfólio de projetos do Peru é formado por projetos de cobre. É muito robusto, mas em ouro e prata a porcentagem é bem menor. É por isso que temos de explorar mais, além de abordar em espaços como o Simpósio do Ouro as principais tendências mundiais que vão afetar o setor. Também precisamos analisar os desafios e as oportunidades, como conflitos sociais, mineração ilegal e mineração como eixo de desenvolvimento.
BNamericas: O Peru está perdendo competitividade?
Palma: Com certeza, e a última pesquisa do Fraser confirma isso. O risco-país aumentou, há pouca certeza sobre o marco regulatório e como ele será aplicado. E o problema do conflito social também está cobrando seu preço. Não há segurança jurídica. O que está acontecendo com a invasão ilegal em Las Bambas não é uma boa mensagem para o mundo. E o Estado não é capaz de colocar ordem na situação. É um mau sinal para o setor de mineração e para o país.
BNamericas: Diante desses desafios, quais são as oportunidades?
Palma: A mineração é um pilar da economia do país, mas também pode ser um eixo ou parceiro transformador para o desenvolvimento e o bem-estar. Além disso, desempenha um papel importante na transformação do mundo em direção a uma economia neutra em carbono.
Até 2050, o mundo tentará descarbonizar a economia, a matriz energética será alterada e o uso de veículos elétricos aumentará. O design das cidades também mudará, com o surgimento das cidades inteligentes. Tudo isso gera uma enorme oportunidade para criar bem-estar, emprego e combater as mudanças climáticas. A mineração é parte integrante desse esforço porque gera os metais para essa transformação.
Como país, temos que nos integrar mais nessa cadeia virtuosa. Já somos o segundo maior produtor de cobre do mundo, mas temos riqueza geológica para nos tornarmos o maior produtor mundial na próxima década, e isso é uma enorme possibilidade para o país.
Se colocarmos em produção a carteira de projetos de mineração que temos, seriam gerados 2 milhões de empregos formais. Isso seria transformador e geraria enormes quantidades de recursos para o país.
BNamericas: Mas algumas vozes do governo estão buscando mudanças no esquema tributário.
Palma: No ano passado, foram gerados 14,5 bilhões de soles [US$ 3,8 bilhões] em contribuições ao Tesouro, três vezes mais do que foi aportado anualmente nos últimos dez anos. Isso se deve ao fato de termos um sistema tributário moderno e progressivo, reconhecido no mundo como altamente técnico, o que faz com que as mineradoras paguem mais quando sua lucratividade aumenta.
Este ano, o Tesouro vai receber um valor igual ou superior ao que recebeu em 2021. Assim, o Estado terá recursos para investir de forma transparente, disciplinada e eficaz na diminuição da desigualdade em setores como água, saneamento, saúde, educação, segurança. Essas são áreas fundamentais para a população, que agora exige que o Estado cumpra seu papel de investir e fechar essas lacunas.
BNamericas: Diante desse contexto, as projeções de produção serão cumpridas este ano?
Palma: Acreditamos que as projeções serão alcançadas. O que nos preocupa é o futuro. Las Bambas, Cuajone e Antamina são maus sinais e afetam a produção de cobre.
Os conflitos precisam ser resolvidos por meio do diálogo, mas sem que o Estado perca seu papel de autoridade. Com isso, devemos cobrir as metas de produção de cobre, ouro e prata.
O que nos preocupa é o que vem a seguir, pois assim que Quellaveco iniciar a produção, os investimentos no setor serão reduzidos significativamente, pois não há outro projeto dessa magnitude em andamento. E o mesmo vale para o ouro. Não existe mais nada desse tamanho.
BNamericas: Apesar de tudo, o Peru continuará sendo um grande produtor mineral?
Palma: Somos e continuaremos sendo um dos maiores produtores minerais do mundo. Atualmente, somos o segundo produtor de ouro da América Latina e ocupamos a 11ª posição no mundo. Em prata, somos o segundo na América Latina e o terceiro no mundo. Em cobre, somos os segundos maiores produtores do planeta. Mas, como país, não devemos nos contentar com isso. Devemos procurar ser os primeiros porque temos potencial geológico para isso. Além disso, temos a força de trabalho necessária. Temos uma tradição milenar na mineração, falta apenas a segurança jurídica e um consenso para que a mineração continue sendo um fator transformador da economia, gerando os recursos que o mundo necessita e trabalhando de mãos dadas com o Estado para reduzir as desigualdades.
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