Como o governo brasileiro prepara o leilão de contratos de hidrovias e portos
Para 2025, o Brasil planeja lançar leilões de hidrovias. O fortalecimento do transporte aquaviário faz parte dos esforços para diversificar a matriz logística, atualmente dominada por rodovias.
As autoridades estão avaliando se os contratos são mais bem oferecidos como concessões ou PPPs. Ao mesmo tempo, os leilões de concessões portuárias continuam a todo vapor.
Eduardo Nery, diretor-geral da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq), conversou com a BNamericas sobre os planos em ambos os segmentos.
BNamericas: Qual o melhor modelo para atração de participantes do setor privado para os contratos de hidrovias planejados pelo governo, concessão ou parceria público-privada (PPP)?
Nery: Na nossa visão, isso terá que ser uma avaliação a ser feita caso a caso. Em alguns, a modelagem mais adequada será o de concessão e, em outros, tende a ser necessário um suporte do governo, mais em linha com um formato de PPP.
Há dois projetos mais adiantados em relação a contratos de hidrovias a serem oferecidos, que são as do rio Madeira [entre Porto Velho, Rondônia, e Itacoatiara, Amazonas] e a hidrovia do rio Paraguai [entre Mato Grosso e Mato Grosso do Sul]. Nessas duas hidrovias, nós já temos um volume de cargas consolidado e a indicação é de que contratos nessas duas hidrovias podem avançar sem qualquer aporte do governo, uma vez que podem se sustentar com uma política de tarifas.
Já em outras hidrovias, onde ainda não há um volume de cargas consolidado, esses contratos podem ser sustentados com aportes do governo, por exemplo, via o fundo criado com os recursos da privatização da Eletrobras.
BNamericas: Então, nas hidrovias do Madeira e do Paraguai a tendência é de contratos de concessões, e não PPPs, sendo oferecidos?
Nery: Sim, nestas duas hidrovias vemos que esses são contratos que são viáveis sem a participação de investimentos do governo.
Mas, como disse, há particularidades nesse segmento. Por isto, demanda uma avaliação caso a caso.
Por exemplo, na hidrovia da Lagoa Mirim, no Rio Grande do Sul, que nós conhecemos também como hidrovia Brasil-Uruguai, o DNIT [Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes] está fazendo a obra de implantação do canal de navegação, ou seja, está sendo feito antes de elaborarmos e oferecermos o contrato para que esse investimento não tenha que ser feito pelo futuro operador.
Então, cada hidrovia tem uma particularidade e avaliamos caso a caso.
BNamericas: Quando devemos ter os leilões para os contratos de hidrovias?
Nery: Ano que vem é plenamente factível termos pelo menos dois: o da hidrovia do rio Madeira e do rio Paraguai.
Devemos lançar até o final deste ano o processo de audiência pública para formulação do edital desses dois projetos e um desses já pode até ser leiloado durante o primeiro semestre do ano que vem.
BNamericas: Quais outros contratos de hidrovia estão em planejamento?
Nery: Temos outros quatro contratos de hidrovias sendo avaliados além desses dois mencionados.
Na hidrovia Brasil-Uruguai, temos intenção de já começar ainda esse ano o processo de audiência pública e, para outros três contratos, queremos fazer a audiência pública no ano que vem: as hidrovias do Barra Norte, do rio Tocantins e do rio Tapajós.
Tocantins e Tapajós são contratos que estão sendo modelados pelo BNDES e os outros quatro projetos estão sendo modelados pela Infra S.A.
BNamericas: Em relação à agenda de leilões de terminais portuários, quais os planos?
Nery: Até o final desse ano o Brasil vai ofertar mais seis contratos de arrendamento de terminais portuários. Esses contratos serão oferecidos em dois leilões, planejados para acontecer entre outubro e dezembro desse ano. Em cada um serão oferecidos três terminais portuários.
Os principais terminais a serem oferecidos serão PAR14 e o PAR15, no porto de Paranaguá, no Paraná, e também ITG02, que é o terminal de minério de ferro no porto de Itaguaí, no Rio de Janeiro.
Esses três terminais juntos gerarão investimentos de R$ 4,5 bilhões, sendo que R$ 1,5 bilhão é o investimento nos terminais PAR14 e PAR15 e R$ 3 bilhões no ITG02.
Além desses, também faremos o leilão de terminais menores, como VDC29 – de Vila de Conde, no Pará – e terminais no porto de Santana, Amapá.
BNamericas: Quais os planos para os terminais no porto de Santos?
Nery: O terminal STS08, destinado a granéis líquidos, deve ter seu processo de audiência pública sendo aberto ainda esse ano.
Já com relação a STS10, o modelo ainda está sob avaliação do Ministério dos Portos e Aeroportos.
BNamericas: Diversas agências reguladoras no Brasil têm reclamado da falta de estrutura. Qual o atual cenário da Antaq em termos de estrutura interna?
Nery: Nós temos operado com um déficit de pessoal de cerca de 25%, que é a diferença do número de servidores que deveríamos ter de acordo com a lei comparado com o que realmente temos de pessoal.
Nos próximos meses, deveremos ter a adição de 30 novos servidores na nossa força de trabalho, e o ideal seria que ano a ano tivéssemos a incorporação de 30 a 40 novos servidores para reduzir o déficit de pessoal.
A Antaq consome pouco orçamento do governo comparado com o retorno gerado.
O orçamento anual da Antaq é de R$ 53 milhões e isto é um valor muito baixo se compararmos com todos os investimentos que o trabalho do regulador gera, como eu já citei em relação a toda essa carteira de leilões projetados, com muito benefício à administração pública e também à economia.
BNamericas: O Brasil já está incorporando riscos ligados a eventos climáticos extremos aos contratos no setor de portos e hidrovias?
Nery: Sem dúvida estamos já contemplando alguns aspectos.
Estamos introduzindo nos contratos mecanismos de compartilhamento de riscos com os futuros concessionários. Uma vez que nós não temos uma série histórica para prever tudo que vai acontecer de forma exata, o que temos feito é incorporar os piores cenários de riscos possíveis nos contratos para que até aquele ponto haja um compartilhamento de riscos e, a partir de um ponto mais extremo, o concessionário passaria a ter direito a pedidos de reequilíbrios contratuais.
Isto é uma forma que encontramos para compartilhar os riscos e não diminuir a atratividade nos leilões.
Além disso, a exemplo do que o Ministério dos Transportes tem feito – de separar 1% nos contratos de concessão de rodovias para projetos de mitigação de riscos climáticos –, também consideramos trazer tais mecanismos ao nosso setor.
Os eventos climáticos extremos já são uma realidade, o desafio agora é prever melhor a intensidade desses eventos.
Esta entrevista foi publicada originalmente em 26 de agosto.
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