Hidrogênio verde e o caminho para a eletromobilidade 2.0

O hidrogênio verde ganha cada vez mais destaque na transição para a eletromobilidade e vários países planejam utilizá-lo, principalmente no transporte de cargas.

No Chile, país que pretende ser exportador líquido do recurso, também vem sendo estudada a possibilidade de utilizá-lo no transporte de passageiros e, inclusive, está em andamento um programa piloto com um ônibus verde a hidrogênio.

A BNamericas conversou com Hernán Nilo, CEO da Sisercom, empresa que assessora o Ministério dos Transportes (MTT) chileno na aplicação dessas tecnologias e que instalou eletroterminais para carros elétricos no país, sobre o potencial do hidrogênio verde no transporte público e os planos da empresa para o restante da América Latina.

BNamericas: Em que consiste o conselho que a Sisercom fornece ao MTT sobre hidrogênio verde?

Nilo: O MTT quer trazer o primeiro ônibus a hidrogênio para o Chile para uso em transporte público. Nesta busca, foi constituído um grupo de trabalho público-privado no qual foram realizadas as tarefas de coordenação e definidos os eixos para realizar a pilotagem, que tem diferentes estruturas: a transferência de hidrogênio, a geração de energia e sua distribuição,

Estamos ajudando na coordenação do projeto. Estamos aqui há alguns meses e há muitas entidades que assinaram um acordo com o MTT para implementação.

Temos empresas que estão contribuindo com sua experiência ou também estão contribuindo com hidrogênio, com dispensação ou transferência. Existem muitas empresas internacionais que já implementaram dispensadores de hidrogênio em diferentes países.

Como em qualquer piloto, o objetivo é conhecer a tecnologia, ver quais são seus benefícios, os cuidados que devem ser tomados para sua implantação e avaliar qual a influência dela nas diferentes rotas de transporte público do país.

O Chile tem condições geográficas muito particulares, e elas vão nos dizer como o ônibus se comporta com as pessoas em seu translado e se pode circular em áreas como Peñalolén, por exemplo, que possuem declives mais acentuados.

Uma vez coletadas as informações, elas serão enviadas em diferentes relatórios para ver como a operação de transporte foi afetada.

É uma aventura que deixa todos muito entusiasmados, pois se entende que o hidrogênio é como a “eletromobilidade 2.0”, porque tem algo de especial: permite-nos gerar percursos mais longos. Com uma carga de hidrogênio, por exemplo, poderiam ser percorridos 400 ou 600 km, o que dobraria ou triplicaria o que se pode percorrer com uma carga em um ônibus elétrico tradicional [230 km].

BNamericas: Em um webinar do Portal Movilidad, você afirmou que, se as condições forem atendidas, os ônibus verdes a hidrogênio serão competitivos em três anos.

Nilo: A primeira barreira é o abastecimento de hidrogênio e as unidades de dosagem. Feito isso, a infraestrutura vai começar a ser implantada e, com isso, os custos devem começar a cair, porque hoje estão muito altos. O mercado passará a ser regulado automaticamente.

Daqui a três anos, se o hidrogênio for implementado como combustível de transporte e os veículos leves movidos a hidrogênio começarem a ser introduzidos, seu custo deve cair. Essa seria a parte competitiva.

Pessoalmente, creio que o hidrogênio será uma contribuição muito significativa no caso do Chile. Somos um país muito extenso, com longas distâncias entre as grandes cidades. O hidrogênio pode ajudar nas viagens de ônibus intermunicipais e caminhões de carga.

Os valores devem ser regulamentados com o mercado para que a tecnologia seja competitiva, mas primeiro temos que avançar com os pilotos e entender seu alcance.

BNamericas Em que outros projetos de eletromobilidade a Sisercom está envolvida no Chile?

Nilo: Estamos trabalhando em outro programa piloto relacionado à segunda vida de baterias de veículos elétricos, que é executado pela agência de sustentabilidade energética e pela Enel X. A parte técnica foi confiada à Sisercom.

Neste caso, temos as baterias de um modelo Nissan e já temos um avanço importante. O produto final que se busca é o armazenamento de energia para um projeto denominado “Casa Inteligente”, que permite entender que as baterias possuem uma segunda vida útil e a forma como podem ser configuradas. Ele será usado para os setores residencial e industrial e até mesmo para distribuição elétrica.

Por exemplo, a energia poderia ser armazenada em horários de menor consumo e liberada nos horários de pico.

A Sisercom também tem operações no Paraguai e na Bolívia e agora estou no Equador, onde estudamos a possibilidade de abrir uma filial, uma vez que vemos como um mercado muito interessante para infraestrutura de recarga.

BNamericas: O que vocês estão fazendo atualmente no Paraguai e na Bolívia?

Nilo: No Paraguai já estamos trabalhando para instalar eletroterminais para transporte público. Esperamos tê-los construídos no ano que vem.

Na Bolívia estamos seguindo o mesmo caminho. Já estamos realizando os primeiros pilotos de eletromobilidade na cidade de Santa Cruz em nível de infraestrutura, e no próximo ano vamos iniciar outros pilotos no país.

Na Bolívia, os sistemas de transporte público funcionam de maneira semelhante ao inglês, baseados em “anéis” dentro das cidades.

A CRE, uma empresa de distribuição de energia, pretende implementar uma “rota verde” com pontos de carregamento rápido entre cidades, de forma a viabilizar a aquisição de veículos elétricos. Seremos o braço de engenharia de infraestrutura e instalação dessa rota.

BNamericas: Qual é a experiência da eletromobilidade no Equador?

Nilo: Estou no Equador há uma semana e me reuni com todos os ministérios envolvidos no assunto.

Estamos participando da consultoria para uma futura lei de eletromobilidade, organizada por uma associação automotiva equatoriana.

O país tem políticas de incentivos econômicos que, por exemplo, fazem com que um veículo elétrico de alto padrão custe menos que um mesmo modelo a combustão, graças à redução de impostos alfandegários e de valor agregado.

O parque eletromotor no Equador cresceu enormemente graças a isso e supera o do Chile em veículos leves, mas isto também gera uma necessidade urgente de um marco regulatório para a implementação de infraestrutura em nível público. Já estamos trabalhando com os ministérios de Energia e Transportes na parte técnica.