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Câmara dos Deputados aprova regulamentação para créditos de carbono

Bnamericas

A Câmara dos Deputados aprovou um projeto de lei que regulamenta o mercado de carbono no Brasil.

A proposta, que segue para sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, estipula um mercado regulado e um mercado voluntário de títulos representativos de emissão ou remoção de gases do efeito estufa. As empresas que mais poluem, deverão seguir uma meta de emissão, podendo usar esses títulos para compensá-la.

Especialistas elogiaram a versão final do projeto de lei, mas também criticaram o tempo que levará para que os créditos de carbono comecem a ser negociados e a exclusão do setor agropecuário do mercado regulamentado.

O mercado regulado de títulos será implantado de forma gradativa ao longo de seis anos. Chamado de Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SBCE), esse mercado permitirá a negociação de Cotas Brasileiras de Emissão (CBE) e de Certificados de Redução ou Remoção Verificada de Emissões (CRVE).

A agropecuária ficará de fora, e as emissões indiretas de dióxido de carbono e outros gases relacionados ao aquecimento global resultantes da produção de insumos, como fertilizantes ou matérias-primas agropecuárias, não serão consideradas para impor obrigações de contenção de emissões.

A decisão está alinhada aos mercados regulados de créditos de carbono em todo o mundo, dada a importância do setor para a segurança alimentar e as incertezas na estimativa de emissões.

O projeto de lei estabelece que cada cota ou CRVE representará 1 tCO2e (tonelada de dióxido de carbono equivalente). No mercado regulado, ao final dos períodos de compromisso, as empresas com atividades reguladas deverão fazer um levantamento das emissões líquidas, e haverá um cancelamento de ambos, pois um certificado de redução ou remoção permite que uma cota de emissão de gases seja cancelada.

A ideia é que, após um período de adaptação, os setores econômicos que tiverem mais dificuldade em reduzir as emissões por meio de processos tecnológicos comprem cotas para poluir e certificados que comprovem a captação do que foi liberado na atmosfera, zerando a emissão líquida.

A compra e venda, quando realizada no mercados financeiro e de capitais, estará sujeita à regulação da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), mas poderá haver colocação privada desses ativos (mercado voluntário).

O texto proíbe a tributação das emissões de gases de efeito estufa provenientes de atividades, instalações ou fontes reguladas pelo SBCE, cuja normatização será de responsabilidade exclusiva do governo federal.

Atividades que emitem mais de 10 mil tCO2e por ano terão alguma tipo de controle, mas com obrigações diferentes. Aquelas com emissões acima desse patamar e até 25 mil tCO2e deverão apresentar um plano de monitoramento das emissões ao órgão gestor da SBCE, enviar um relatório anual de emissões e remoções de gases e cumprir outras obrigações previstas em decreto ou ato específico desse órgão gestor.

Aqueles que realizarem atividades com emissões acima de 25 mil tCO2e por ano, além dessas obrigações, terão que enviar ao órgão gestor um relatório anual de conciliação periódica das obrigações (emissão igual à captação).

SANEAMENTO

Já para o setor de saneamento, o texto isenta do cumprimento as empresas que tratam e destinam resíduos sólidos e efluentes líquidos quando comprovarem que adotaram sistemas e tecnologias para neutralizar tais emissões.

FASES

O mercado regulado será implementado em cinco fases. Os regulamentos serão emitidos na primeira fase, que durará 12 meses e poderá ser estendida por mais 12. Na fase seguinte, os operadores das atividades reguladas terão um ano para implantar instrumentos de medição para relatar as emissões.

Na fase três, que dura dois anos, esses operadores terão apenas que entregar, ao órgão gestor do sistema, um plano de monitoramento e um relatório de emissões e remoções de gases de efeito estufa.

Na fase quatro, entrará em vigor o primeiro Plano Nacional de Alocação, com distribuição gratuita de cotas de emissão (CEB) e implementação do mercado de ativos (negociação em bolsa de cotas de emissão e certificados de remoção de gás).

A última fase resultará na implantação completa do SBCE.

TRIBUTAÇÃO

A tributação dos ganhos com a negociação de títulos ou mesmo de créditos de carbono seguirá a legislação atual de Imposto de Renda para cada contribuinte e deve ser classificada como ganhos líquidos se a negociação ocorrer em bolsas de valores, commodities e futuros e mercados de balcão organizados. Em todos os outros casos, os ganhos de capital serão tributados.

RESERVAS LEGAIS

A restauração, a manutenção e a conservação de áreas de preservação permanente, de reservas legais ou de uso restrito e de unidades de conservação poderão gerar créditos de carbono nos termos do regulamento.

COMPANHIAS DE SEGUROS

As seguradoras, as entidades abertas de previdência complementar, as sociedades de capitalização e as resseguradoras locais também deverão comprar, no mínimo, 1% de ativos ambientais ao ano para compor suas reservas e técnicas e de provisões.

OPINIÕES DE ESPECIALISTAS

Felipe Bittencourt, CEO da consultoria WayCarbon, disse que ainda levará muito tempo para que os créditos de carbono sejam comercializados em escala.

“Os prazos são muito longos para as fases, em especial os dois anos para que as empresas emissoras reportem as emissões para o Governo”, disse à BNamericas.

Bittencourt criticou a exclusão do agronegócio, dado seu alto potencial de sequestro de carbono. “Essa deveria ser uma lei mais leve e aí os setores podem entrar ou não [no mercado regulado] por decreto.”

Por outro lado, o consultor considerou positivo o estabelecimento de compromissos para seguradoras, sociedades de capitalização e resseguradoras.

“Para o mercado de carbono é muito bom, porque traz segurança e liquidez, independente das metas da indústria, então vai sempre ter alguém comprando um volume significativo, o que vai deixar o mercado mais dinâmico.”

Para Lúcia Aragão, advogada do Vieira Rezende, o texto aprovado foi significativamente aprimorado graças às mudanças feitas no Senado. Ela destacou pontos como a possibilidade de incluir projetos de REDD+ (redução de emissões por desmatamento e degradação), que são predominantes no país, e a possibilidade de usufrutuários desenvolverem projetos de carbono, de forma a ampliar significativamente as oportunidades em áreas indígenas e em territórios de comunidades tradicionais.

Outro ponto positivo é a interoperabilidade prevista no texto, permitindo a integração entre os mercados voluntário e regulado, bem como a possibilidade de integração com os mercados internacionais.

“Essa medida viabiliza a flexibilidade e o alcance global das políticas de mitigação de emissões, em conformidade com o disposto no Artigo 6 do Acordo de Paris”, apontou Aragão à BNamericas.

Ela destacou que o projeto de lei classifica os ativos que compõem o SBCE e os créditos de carbono como valores mobiliários, o que fortalece o mercado e aumenta sua atratividade para investimentos necessários à transição para uma economia de baixo carbono.

Aragão ressaltou pontos problemáticos como a demora na aprovação da lei, que gera desafios na adaptação ao mercado global, e a exclusão do agronegócio. Além disso, há lacunas que dependem de regulamentações complementares, principalmente no que se refere à governança do SBCE.

Outra preocupação é como se dará a integração entre sistemas nacionais e internacionais, como os de certificadoras ou sistemas de registro.

“É essencial que o sistema nacional seja adaptável, transparente e alinhado com padrões globais para que se garanta a credibilidade e a competitividade dos créditos brasileiros”, afirmou.

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