Data Insights: a participação chinesa nos principais setores industriais brasileiros
A China consolidou-se como o maior parceiro comercial e de investimento do Brasil, visando infraestrutura, TIC, energia elétrica e petróleo e gás, mas o impulso também gera controvérsias.
Embora a necessidade de mercadorias seja o principal motor do aumento do comércio, os investimentos são feitos por diversas razões.
“Existem diversos motivos que explicam a presença da China nos mais variados setores. Na área de energia elétrica, os projetos no Brasil têm características semelhantes em termos de tamanho, necessidades de investimentos, em comparação com a China, então as empresas chinesas se sentem mais familiarizadas com o segmento”, disse à BNamericas Alexandre Pierantoni, chefe da área de finanças corporativas e M&A da consultoria Kroll.
Segundo números compilados pela equipe de projetos da BNamericas, os players chineses estão presentes em 12,5% dos projetos nas áreas de infraestrutura, TIC, energia elétrica e petróleo e gás – seja como principais investidores, operadores ou como participantes de consórcio com empresas principalmente locais.
As empresas chinesas estão presentes em quase 18% dos projetos de energia elétrica, principalmente na transmissão, 8,33% dos projetos de TIC, 4,68% no setor de petróleo e gás e 4,67% na infraestrutura.
A State Grid Brazil Holding (SGBH) planeja investir R$ 200 bilhões (US$ 40 bi) no Brasil nos próximos anos.
Em dezembro, a empresa ganhou o maior lote de transmissão já oferecido pelo Brasil, envolvendo o sistema Graça Aranha, de 1.468 km, que utilizará corrente contínua de ultra-alta tensão e exigirá investimentos de R$ 18 bilhões nos próximos cinco anos.
“Temos uma excelente relação com a China e agradecemos pelos investidores a acreditarem no Brasil. Somos um país que respeita contratos e que possui estabilidade e segurança jurídica, tão importantes para o setor elétrico”, declarou o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira.
“Na área de TIC, é uma diversificação geográfica que as empresas tecnológicas chinesas procuram, por isso investem em projetos e ativos no Brasil”, acrescentou Pierantoni.
O setor é também palco de tensões geopolíticas, uma vez que os EUA tentam combater a influência chinesa e empresas como a Huawei, mas também países como o Brasil desempenham um papel importante.
PARCERIAS
Os dados compilados pela BNamericas mostram que as empresas chinesas não têm preferência pelo controle dos projetos e estão abertas a parcerias com empresas ou autoridades locais. Do total de projetos com participação chinesa, 77,7% envolvem controle indireto e o restante controle direto.
“Existem áreas no Brasil que são extremamente complexas devido à legislação e regulamentação de operações, e é por isso que as empresas estrangeiras optam por trabalhar em conjunto com empresas locais”, comentou à BNamericas Alexandre Garcia, diretor da Fitch Ratings.
No setor de petróleo e gás, CNPC, CNOOC e CNODC são sócias da Petrobras no pré-sal.
Além delas, a joint venture hispano-chinesa Repsol Sinopec tem desenvolvido grandes projetos offshore de petróleo e gás, envolvendo investimentos de cerca de US$ 10 bilhões. E os estaleiros chineses ainda dominam a construção de FPSOs para os campos da Petrobras.
INFRA
Em fevereiro, um consórcio formado pela brasileira Comporte e pela chinesa CRRC venceu um leilão para o Trem Intercidades, de 101 km e estimado em R$ 13,5 bilhões, a ser construído e operado como uma parceria público-privada.
No mesmo mês, a concessionária que constrói a ponte rodoviária Salvador-Itaparica, na Bahia, iniciou os testes de perfuração para o projeto de PPP, que requer investimentos estimados em R$ 9 bilhões.
O contrato de PPP assinado em 2020 envolve o estado da Bahia e um consórcio chinês formado por Railway 20 Bureau Group Corporation (CR20) e China Communications Construction Company (CCCC).
A concessão de 35 anos é para construção, operação e manutenção. O projeto inclui ainda novos acessos rodoviários e viadutos.
“Na área de infraestrutura, a entrada chinesa acontece gradativamente, porque as empresas demoram para se acostumar com as regulamentações locais e com a lentidão de alguns procedimentos no Brasil”, afirmou à BNamericas Joubert Flores, presidente da Associação Nacional de Transporte de Passageiros sobre Trilhos (ANPTrilhos) e ex-diretor-geral de engenharia da chinesa BYD.
“A China tem tecnologia para construir linhas de trens de alta velocidade – construiu mais de 1.000 km de ferrovias de alta velocidade ligando Pequim e Xangai em cerca de dois anos. Aqui, o projeto do Trem Intercidades, que tem 100 km de extensão, provavelmente estará pronto somente em 2031. Esta diferença nos prazos de execução dos projetos mostra uma série de dificuldades regulatórias e de licenciamento que exigem mais tempo dos projetos no Brasil, por isso demorou para os players chineses se acostumarem com o setor”, acrescentou.
POLÊMICA
A presença da China também gerou controvérsias, à medida que surgiram alegações de práticas anticompetitivas.
Siderúrgicas pediram ao governo que impusesse tarifas especiais sobre as importações chinesas, e a indústria automotiva passa por um influxo maciço de veículos elétricos.
Algumas empresas também reclamam que players chineses sem presença física no Brasil consideram participar de licitações, violando potencialmente as regras.
“Temos informações de que empresas chinesas estão dispostas a vender trens para governos estaduais no Brasil sem ter fábrica operando no Brasil, só se comprometendo a criar uma unidade caso ganhem contratos. Esta prática é questionável, pois não está claro como essas empresas calcularão o preço correto para concorrer em uma licitação se não souberem quanto custa ter uma fábrica em operação”, disse à BNamericas um executivo de uma fabricante de material rodante, solicitando anonimato.
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