O estado atual e as expectativas em torno da dessalinização no Brasil

Recentemente, alguns projetos de dessalinização avançaram no Brasil, mas as principais condições para uma expansão mais ampla ainda não se materializaram.

As iniciativas de dessalinização no país são descentralizadas, envolvendo múltiplos stakeholders – incluindo os governos federal e estadual, bem como empresas privadas. A maioria dos projetos está concentrada no Nordeste, uma região historicamente afetada por secas prolongadas.

O programa Água Doce, coordenado pelo Ministério da Integração e Desenvolvimento Regional, tem como objetivo melhorar o abastecimento de água em áreas rurais.

“O Programa Água Doce é uma ação do governo federal coordenada pelo Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional que visa promover o abastecimento de água em localidades rurais do semiárido brasileiro por meio da tecnologia de dessalinização. O programa implantou 152 sistemas de dessalinização nos últimos dois anos, com investimentos da ordem de R$ 47 milhões. Além disso, está em execução a planta de dessalinização do município de Galinhos, que irá atender a zona urbana do município com um investimento de cerca de R$ 6 milhões”, informou o ministério à BNamericas.

“Para os próximos anos, o investimento planejado é de cerca de R$ 111 milhões para promover a implantação de sistemas de dessalinização em estados do semiárido brasileiro.Lançado em 2004, durante o primeiro governo Lula, o programa já beneficiou aproximadamente 264 mil pessoas em 298 municípios do semiárido brasileiro, com 1.068 sistemas de dessalinização implantados”, acrescentou.

O maior projeto em andamento envolve parcerias entre governos estaduais e o setor privado. A construção da maior usina de dessalinização do país para consumo humano está programada para começar no primeiro semestre deste ano e ser concluída no primeiro semestre de 2027. A instalação terá uma capacidade de produção de 86,4 Ml/d (milhões de litros por dia).

Originalmente programada para começar no ano passado, a construção foi adiada devido a preocupações sobre riscos potenciais a 17 cabos submarinos que aterrissam em Fortaleza. Para evitar interferência na infraestrutura de telecomunicações, a planta foi realocada a 560 metros de seu local inicial na Praia do Futuro.

Quando estiver em operação, a usina beneficiará 720 mil pessoas na cidade. A planta será construída pela Águas de Fortaleza, um consórcio liderado pela empresa de infraestrutura Marquise, com apoio da concessionária estadual Cagece.

O investimento inicial de capital foi definido em R$ 526 milhões de reais, com custos operacionais estimados em R$ 2,26 bilhões. No entanto, estes números estão atualmente sob revisão, revelou o diretor da Águas de Fortaleza, Renan Carvalho, à BNamericas.

A maior usina de dessalinização existente no Brasil iniciou suas operações em 2021, quando a siderúrgica ArcelorMittal investiu R$ 50 milhões em uma instalação de 500 m³/h (metros cúbicos por hora) para abastecer suas operações no estado do Espírito Santo.

“O Brasil enfrenta desafios hídricos significativos, e a dessalinização se apresenta como uma solução estratégica para garantir a segurança hídrica em diversas regiões. O crescimento populacional, a urbanização acelerada e as mudanças climáticas aumentam a pressão sobre os recursos hídricos existentes. Países com condições climáticas semelhantes já adotaram amplamente essa tecnologia com bastante sucesso”, disse Carvalho.

No entanto, o Brasil detém as maiores reservas de água doce do mundo, o que leva alguns a questionar a necessidade de iniciativas de dessalinização em larga escala. Além disso, o desenvolvimento de projetos de hidrogênio verde pode aumentar a demanda por usinas de dessalinização adicionais devido ao alto consumo de água.

Produzir 1 kg de hidrogênio verde requer 9 litros de água, de acordo com um estudo de 2019 da Agência Internacional de Energia. “O acesso à água doce pode ser um problema em áreas com escassez de água. Usar água do mar pode se tornar uma alternativa em regiões costeiras”, observa o documento.

No entanto, após um período de inúmeros anúncios de memorandos de entendimento para projetos de hidrogênio verde, o ímpeto parece ter diminuído.

“Como resultado, alguns projetos levarão mais tempo do que o esperado, talvez avançando apenas nos próximos dois anos, devido aos desafios que os projetos de hidrogênio verde enfrentam para garantir contratos de compra e alcançar viabilidade econômica”, comentou à BNamericas uma fonte em cargo executivo de um banco de desenvolvimento internacional com operações no Brasil.