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Os desafios futuros para os cabos submarinos na América Latina

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Os desafios futuros para os cabos submarinos na América Latina

Impulsionado pelo aumento do tráfego global e das trocas de conteúdo, o segmento de cabos submarinos na América Latina continua próspero, com vários projetos em desenvolvimento e atualizações de capacidade em andamento para sistemas mais antigos.

No entanto, permanecem gargalos importantes impedindo um progresso mais rápido. Eles incluem a necessidade de maior diversidade de rotas e pontos de aterrissagem, políticas industriais para desenvolver fornecedores e lançadores locais, além de programas de proteção de cabos costeiros, conforme destacaram atores do setor em um evento na semana passada.

Rogério Mariano, diretor global de planejamento de rede da Azion, está entre os que defendem a criação de programas de proteção de cabos submarinos nos diversos países da região, a exemplo do que já acontece na Europa e em outros mercados.

A Azion é uma das empresas líderes em computação de ponta e interconectividade nas Américas, e Mariano é um especialista de longa data em cabos submarinos.

“Proteção e resiliência dos cabos é fundamental. Temos trabalhado há um ano e meio nisso. Ano passado tivemos três incidentes considerados importantes: o corte do cabo SACS e GlobeNet, em setembro do ano passado, por uma embarcação. Um segundo evento, o corte do WACS [cabo na costa da África, da Angola Cables]. O terceiro foi [o conflito em torno da] usina de dessalinização em Fortaleza, que está pacificado agora, mas tomou muito tempo”, disse o executivo no evento.

Atualmente há cerca de 400 cabos submarinos de internet no mundo, que juntos se estendem por mais de 1,2 milhões de quilômetros. Mais de 95% de todos os dados que circulam pelo mundo passam por essas estruturas. Cerca de 70% dos danos a cabos submarinos são causados por âncoras de barcos/navios e barcos de pesca, segundo Mariano. Outros riscos incluem mineração, dragagem e até deslizamentos de terra subaquáticos.

“Manutenção dos cabos é um dos principais desafios da indústria, embora isto tenha claramente evoluído ao longo dos anos. É preciso reforçar o monitoramento das embarcações. As âncoras e os equipamentos de pesca são as principais causas de rompimento dos cabos”, explicou Romualdo Rocha, diretor de infraestruturas e operações de rede da Telxius na América Latina.

A Telxius, unidade de infraestrutura de telecomunicações do grupo Telefónica, opera mais de 100 mil km de cabos e cerca de 100 pontos de presença em 17 países.

A empresa possui cabos próprios e cabos operados em consórcio com outras empresas.

GEOPOLÍTICA

Embora a América Latina seja considerada uma região relativamente estável, questões geopolíticas têm surgido como um foco crescente de atenção, à medida que as suspeitas de sabotagem deliberada de sistemas submarinos por países rivais aumentaram nos últimos anos.

O problema é especialmente crítico para rotas que não têm redundância ou não contam com acordos de roteamento de tráfego em vigor com outros sistemas.

Mariano e Rocha apoiam a criação de zonas de proteção ao longo das costas, perto de pontos de aterrissagem de cabos e estações de aterrissagem.

“Estamos buscando junto aos órgãos brasileiros desenvolver uma política de proteção a essas redes – Marinha, GSI [Gabinete de Segurança Institucional], Anatel [Agência Nacional de Telecomunicações] e Ibama. E isto vale para a América Latina como um todo. Maldonado no Uruguai, Las Toninas na Argentina, Valparaíso no Chile e também no Peru, na Colômbia e em todo o mar caribenho. Precisamos como indústria tomar uma série de medidas para nos proteger e para preservar as redes”, acrescentou Mariano.

Outro ponto levantado pelos executivos é a diversificação dos pontos de aterrissagem para evitar a centralização dos cabos em um único local.

Para Rafael Lozano, country manager da EllaLink Cable no Brasil, há países com regulamentações específicas para evitar essa concentração.

“Se alguém entra em guerra conosco e explode a Praia do Futuro em Fortaleza, a América Latina toda fica às cegas”, disse.

Fortaleza, no Ceará, é um ponto de aterrissagem para 17 cabos submarinos de oito empresas diferentes. A cidade é o principal polo de cabos submarinos na América Latina.

POLÍTICAS INDUSTRIAIS

O desenvolvimento de empresas locais especializadas em equipamentos para cabos submarinos ou pelo menos na implantação de cabos submarinos é tido como essencial para reduzir os custos do projeto.

Isso poderia acontecer por meio de políticas industriais de longo prazo, lideradas pelo governo e voltadas para o setor, de acordo com alguns executivos.

“Cabo submarino é essencial, mas muito caro. O investimento precisa se pagar. Muitas vezes se fazem consórcios para diluir os custos”, afirmou João Januário, gerente de engenharia submarina da V.tal.

Conforme relatado pela BNamericas, a V.tal está planejando novos cabos na América Latina.

Rodrigo Carvalho, especialista em redes submarinas da Angola Cables, concorda com os desafios financeiros envolvidos nos projetos.

A Angola Cables não tem planos de investir em novos cabos, embora considere entrar em cabos projetados de terceiros, segundo Carvalho. A empresa aposta principalmente em pontos no nordeste brasileiro.

FABRICAÇÃO E IMPLANTAÇÃO

Em termos globais, o ecossistema de cabos submarinos é altamente concentrado.

Os principais fabricantes de cabos são a norte-americana SubCom, a japonesa NEC, a chinesa HMN e a francesa ASN (França).

O tópico é considerado tão estratégico que o governo francês adquiriu a ASN, antiga Alcatel Submarine Networks, da Nokia.

Além disso, OTTs e big techs, que antes eram apenas clientes, começaram a investir elas mesmas na construção de cabos submarinos.

A América Latina não tem um fabricante de cabos submarinos no momento. Rocha, da Telxius, comentou que a empresa não contrata a NEC porque “é caro” e não contrata os chineses “por outros motivos”.

No passado, a empresa brasileira de equipamentos ópticos Padtec tinha uma unidade focada em sistemas submarinos, mas ela foi vendida. Tanto Rocha quanto Mariano citaram a Padtec como uma opção regional para o setor.

A BNamericas apurou junto a fontes próximas à Padtec que a empresa está de fato pensando em retornar ao nicho de equipamentos para cabos submarinos.

Incentivar a indústria naval a desenvolver embarcações lançadoras de cabos submarinos é outro ponto importante, segundo os executivos. A frota global de embarcações especializadas para essa atividade é pequena e, como a demanda é alta, os preços dos fretes aumentaram e os prazos estão sendo adiados.

“Temos uma empresa [Blue Marine Telecom] que desenvolveu o cabo da Petrobras e está se mobilizando para ter embarcações e estruturas para implantação de cabos submarinos no Brasil”, concluiu Rocha, sugerindo que ela pode vir a ser essa especialista local.

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